DECRETO Nº 2.956, de 03 de fevereiro de 1999
Aprova o V Plano Setorial para os Recursos do Mar (V PSRM).
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84, incisos IV e VI, da Constituição,
DECRETA:
Art. 1º - Fica aprovado, na forma do Anexo a este Decreto, o V Plano Setorial para os Recursos do Mar ( V PSRM), que a este acompanha, definindo as diretrizes e prioridades para o setor no período 1999-2003.
Art. 2º - Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
V PSRM
1 - INTRODUÇÃO
2 - VIGÊNCIA
3 - FATORES CONDICIONANTES
4 - OBJETIVO
5 - MECANISMOS DE INTEGRAÇÃO E INTERFACES
6 - RECURSOS DO MAR
6.1 - Recursos Vivos
6.2 - Recursos Não-Vivos
7 - ESTRATÉGIAS DE AÇÃO
7.1 - Pesquisas Prioritárias
7.1.1 - Levantamento do Potencial Sustentável dos Recursos Vivos
7.1.2 - Recursos Pesqueiros
7.1.3 - Avaliação da Potencialidade Mineral da Plataforma Continental
7.1.4 - Processos Físicos, Químicos, Geológicos e Biológicos:
Oceânicos e Costeiros
7.1.5 - Estudo Integrado dos Ecossistemas Oceânicos e Costeiros
7.1.6 - Estudo e Monitoramento Oceanográfico e Climatológico em Escala Global
7.1.7 - Biodiversidade e Biotecnologia
7.2 - Unidades de Conservação
7.3 - Dados e Informações
7.3.1 - Coleta de Dados
7.3.1.1 - Embarcações de Pesquisa
7.3.1.2 - Sensoriamento Remoto e Bóias
7.3.1.3 - Estações Costeiras
7.3.1.4 - Estatística Pesqueira
7.3.2 - Intercalibração e Padronização
7.3.3 - Gerenciamento e Disponibilização de Dados e Informações
7.4 - Formação de Recursos Humanos
8 - RECURSOS FINANCEIROS E LOGÍSTICOS
9 - ANÁLISE E ACOMPANHAMENTO
V PLANO SETORIAL PARA OS RECURSOS DO MAR (V PSRM)
1 - INTRODUÇÃO
A Política Nacional para os Recursos do Mar (PNRM) tem por finalidade fixar as medidas essenciais tanto à promoção da integração do Mar Territorial, da Plataforma Continental e da Zona Econômica Exclusiva (ZEE), ao espaço brasileiro e quanto ao uso sustentável dos recursos do mar, compreendidos os recursos vivos e não-vivos da coluna d'água, solo e subsolo, que apresentem interesse para o desenvolvimento econômico e social do país.
A PNRM se consubstancia em planos e em programas plurianuais e anuais decorrentes, elaborados pela Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM), e que se desdobram em projetos específicos, os quais são os documentos básicos de trabalho.
Compete à CIRM, nos termos da legislação em vigor, coordenar os assuntos relativos à consecução da PNRM e propor ao Presidente da República as prioridades para os programas e projetos que a integram.
A implementação das atividades relativas aos recursos do mar se dá de forma descentralizada, por meio de diversos agentes, no âmbito de vários ministérios, estados, municípios, instituições de pesquisa, comunidade científica e iniciativa privada, de acordo com as suas respectivas competências e em consonância com as diretrizes estabelecidas na PNRM.
O Plano Setorial para os Recursos do Mar (PSRM), com vigência plurianual, constitui um desdobramento da PNRM.
Assim, o planejamento de todas as atividades relacionadas com os recursos do mar, nos diversos organismos envolvidos com esta área, deve guardar conformidade com as diretrizes do PSRM.
Da mesma forma, ao buscar o uso sustentável dos recursos do mar, a PNRM mantém estreita consonância e articulação com a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81).
O I PSRM, com vigência no período de 1982 a 1985, possibilitou uma melhor estruturação das atividades de pesquisa e de prospeção dos recursos do mar, orientando interesses significativos da sociedade brasileira para a incorporação desses recursos ao sistema produtivo nacional.
O II PSRM, abrangendo o período de 1986 a 1989, estabeleceu objetivos que pudessem contribuir, de forma imediata e eficaz, para a superação das dificuldades sócio-econômicas do País e concorreu para uma melhor capacitação técnica e científica das organizações e dos recursos humanos envolvidos nos seus projetos.
O III PSRM, vigente entre 1990 e 1993, considerou, basicamente, que as diretrizes e prioridades do II PSRM continuariam válidas para aquele período, além de levar em conta os efeitos da ratificação, pelo Brasil, da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), estabelecendo como meta principal a investigação e explotação racional dos recursos da Zona Econômica Exclusiva (ZEE).
Após a aprovação do III PSRM e do estabelecimento de sua meta principal, qual seja, o levantamento dos potenciais sustentáveis de captura dos recursos vivos na ZEE, foi concebido um programa específico para operacionalizar a consecução dessa meta, então denominado "Programa para o Levantamento dos Potenciais Sustentáveis de Captura de Recursos Vivos da Zona Econômica Exclusiva" (REVIZEE).
Concebido como um detalhamento da meta principal a ser alcançada, dentre os objetivos a serem atingidos pelo III PSRM, o Programa REVIZEE refletiu a preocupação da CIRM com relação às responsabilidades assumidas pelo Brasil quando da ratificação de sua adesão à CNUDM.
O IV PSRM, com vigência entre 1994 e 1998, foi uma adequação do III PSRM. Mantendo o mesmo objetivo, estabeleceu a mesma meta principal, ou seja, a implementação do Programa REVIZEE, o qual, ganhando um novo impulso institucional, foi reestruturado e definido como "Programa de Avaliação do Potencial Sustentável dos Recursos Vivos na ZEE", uma vez que suas prioridades e diretrizes continuavam válidas. Esta nova versão do Programa foi elaborada por um grupo de especialistas em recursos do mar, oriundos da comunidade científica.
O V PSRM, orientado pelas diretrizes e prioridades nele contidas, constitui uma atualização do IV PSRM, adequando-o à conjuntura prevista para o período de sua vigência.
2 - VIGÊNCIA
O V PSRM vigorará no período de 1999 a 2003.
3 - FATORES CONDICIONANTES
Além da Política Nacional para os Recursos do Mar, o V PSRM é condicionado e está em consonância com os instrumentos básicos do Direito Internacional dos quais o Brasil é signatário - que definem a moldura jurídica global e balizam as ações que cada país deve desenvolver para que seja alcançada a meta comum de uso sustentável dos recursos do mar - tais como, "inter alia":
- Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), assinada pelo Brasil em 1982 e ratificada em 1988 e que se encontra em vigor desde 16/11/94. A CNUNDM, um dos maiores empreendimentos da história normativa das relações internacionais, dispõe sobre os usos dos espaços marítimos e de seus recursos;
- Acordo Relativo à implementação da Parte XI da CNUDM, em vigor desde 1996, que flexibilizou alguns dispositivos da CNUDM que dizem respeito aos recursos da "Área", permitido, dessa forma, que países de todos os blocos e regiões geográficas, até então reticentes, aderissem à Convenção;
- Agenda 21, adotada na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), realizada no Rio de Janeiro, em 1992 (RIO-92), cujo Capítulo 17 se dedica à proteção dos oceanos, de todos os tipos de mares e das zonas costeiras, e proteção, uso racional e desenvolvimento de seus recursos vivos;
- Convenção sobre Diversidade Biológica, também ratificada pelo Brasil e em vigor desde 1994, cujo objetivo é assegurar a manutenção da diversidade biológica e promover a repartição justa e eqüitativa dos benefícios advindos do uso de recursos genéticos;
- Código de Conduta para a Pesca Responsável, aprovado na 18ª Reunião da FAO, em 1995, que apresenta um conjunto de diretrizes para as políticas do setor da pesca, baseado em princípios de uso sustentável e equilíbrio na distribuição dos benefícios econômicos;
- Acordo para a Implementação das Disposições da CNDUM sobre Estoque de Peixes Transzonais e de Peixes Altamente Migratórios, assinado pelo Brasil em 1997, que visa assegurar a conservação a longo prazo e o uso sustentável de estoque de peixes transzonais e altamente migratórios, instando a cooperação entre os Estados para este fim;
- Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios (MARPOL 1973/1978), cujos anexos I e II estão em vigor no Brasil desde 29/04/88, enquanto os anexos III, IV e V entraram em vigor só em 1998 (Dec. nº 2508, de 04/03/98), possibilitando a aplicação integral desta Convenção no país, contendo regras para a proteção do meio ambiente nos mares e zonas costeiras, contra a poluição, para a eliminação da poluição internacional por óleo e outras substâncias nocivas e para a minimização dos despejos acidentais de tais substâncias;
- Convenção sobre a Prevenção da Poluição Marinha por Alijamento de Resíduos e outras Matérias (Convenção de Londres, 1972), objetivando "o controle efetivo de todas as fontes de contaminação do meio marinho, capazes de gerar perigos à saúde humana, prejudicar os recursos biológicos e a vida marinha, bem como danificar as condições ou interferir em outras aplicações legítimas do mar";
- Convenção Internacional sobre Preparo, Resposta e Cooperação, em caso de Poluição por Óleo, 1990 (OPRC 90);
- Convenção Internacional sobre Responsabilidade Civil por Danos Causados por Poluição por Óleo (CLC-69);
- Convenção sobre o Controle de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos e seu Depósito (Convenção de Basiléia);
- Convenção de RAMSAR - Convenção Relativa às Áreas Úmidas de Importância Internacional, Especialmente como Habitat de Aves Aquáticas, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto 33/92; e
- Convenção sobre Mudanças Climáticas, firmada no Rio de Janeiro, em 1992 e em vigor desde 1994, sendo de grande relevância para os oceanos. A compreensão mais abrangente do papel dos oceanos na formação do clima na Terra também condiciona as linhas de pesquisas consideradas prioritárias no PSRM.
O V PSRM é condicionado, ainda, pela legislação interna, como a própria Constituição de 1988, a qual já incorpora os conceitos de espaços marítimos definidos pela CNUDM, considera o mar territorial e os recursos da Zona Econômica Exclusiva e da Plataforma Continental como bens da União e a zona costeira como patrimônio da União. São relevantes também:
- O Decreto-Lei nº 221, de 28/02/67, que institui o Código de Pesca;
- O Decreto-Lei nº 227, de 28/02/67, que institui o Código de Mineração;
- A Lei nº 6.938, de 31/08/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação;
- O Decreto nº 96.000, de 02/05/88, que estabelece as normas para a realização de pesquisa e investigação científica na Plataforma Continental e em águas sob jurisdição brasileira;
- A Lei nº 7.661, de 16/05/88, que institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro;
- A Lei nº 8.617, de 04/01/93, que dispõe sobre o Mar Territorial, a Zona Contígua, a Zona Econômica Exclusiva e a Plataforma Continental brasileiros;
- A Política Marítima Nacional, aprovada pelo Decreto nº 1.265, de 11/10/94;
- A Lei nº 9.433, de 08/01/97, que dispõe sobre a Política Nacional de Recursos Hídricos e institui o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;
- A Lei nº 9.537, de 11/12/97, que dispõe sobre a Segurança do Tráfego Aquaviário em águas sob jurisdição nacional (LESTA);
- A Lei nº 9.605, de 12/02/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente - Lei de Crimes Ambientais;
- A Lei nº 9.636, de 15/05/98, que dispõe sobre a Administração de Áreas de Patrimônio da União; e
- As resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente.
O V PSRM se pauta pelo "princípio da precaução" na exploração e uso dos recursos do mar, o qual preconiza que a ausência de informações científicas completas e/ou a falta de certeza absoluta não devem ser utilizadas como motivos para postergar a adoção de decisões e medidas eficazes para impedir a degradação do meio ambiente, quando houver risco de dano ecológico grave ou irreversível.
O V PSRM é, ainda, condicionado pelos demais mecanismos de gestão integrada dos ambientes costeiros e marinhos, principalmente pelo Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, com o qual tem articulação e guarda coerência.
O V PSRM incorpora, também, os conceitos atuais de sustentabilidade (ecológica, econômica e social) e a necessidade do planejamento descentralizado e participativo, como forma de integração das partes envolvidas e garantia de efetiva consecução de suas propostas.
4 - OBJETIVO
O V PSRM tem como objetivo primordial o conhecimento e a avaliação da potencialidade dos recursos vivos e não-vivos das áreas marinhas sob jurisdição nacional e adjacentes, visando à gestão e ao uso sustentável desses recursos.
5 - MECANISMOS DE INTEGRAÇÃO E INTERFACES
A utilização concomitante dos ambientes terrestres e marinhos na zona costeira tem atraído atenção renovada para o gerenciamento costeiro integrado e tem compelido os órgãos nacionais e internacionais a buscarem a compatibilização de planos e programas marinhos, com aqueles referentes à gestão costeira.
Por isso, torna-se especialmente relevante criar novos mecanismos e/ou fortalecer os já existentes, com vistas a intensificar a integração do V PSRM com o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro-PNGC e seu Programa Nacional de Gerenciamento Costeiro-GERCO. Da mesma forma, o Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira (LEPLAC), cujo propósito é estabelecer o limite exterior da Plataforma Continental, no seu enfoque jurídico, de acordo com os dispositivos da CNUDM, certamente se constitui em importante base de dados científicos para o PSRM, além de, naturalmente, fornecer os limites geográficos/jurisdicionais para os seus principais programas (REMPLAC/REVIZEE). Esta integração fica favorecida pelo fato desses planos estarem inseridos no âmbito da CIRM.
Ademais, o PSRM deve ter uma interface com os seguintes programas:
- Programa Global de Ação para Proteção do Meio Ambiente Marinho frente às Atividades Baseadas em Terra- PGA ("Global Programme of Action for the Protection of the Marine Environment from Land-Based Activities"- GPA), vinculado ao Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), tendo como ponto focal no Brasil, o MMA, com o objetivo de prevenir a degradação do mar causada por atividades realizadas em terra;
- Programa Nacional da Diversidade Biológica (PRONABIO), de responsabilidade do MMA, cujo propósito é o de levantar e disseminar informações sobre a biodiversidade, identificando processos de degradação e oportunidades e ações prioritárias para a utilização sustentável dos recursos biológicos;
- Programas, projetos e iniciativas para proteção de ecossistemas e de espécies marinhas ameaçadas, e responsabilidade do MMA-IBAMA; e
- Programa de Consolidação do Sistema de Unidades de Conservação do MMA-IBAMA, cujo propósito é planejar e gerenciar áreas naturais protegidas, para viabilizar os objetivos nacionais de conservação correspondentes.
Além disso, é necessária a integração com as iniciativas já existentes para ordenamento, fomento e desenvolvimento da pesca e da maricultura, obedecendo assim às disposições da CNUDM.
É essencial, também, a integração do PSRM com o Programa Piloto em Ciências do Mar, do MCT, e com os programas de C & T marinha do CNPq e da FINEP, para que tais mecanismos de apoio às pesquisas possam, realmente, contribuir para os objetivos nacionais relativos aos recursos do mar, consubstanciados no PSRM.
Deve-se destacar, ainda, a importância da integração do PSRM com programas internacionais, tais como: Global Ocean Observing System (GOOS), Global Investigation of Pollution in the Marine Environment (GIPME), Ocean Science in Relation to Non-Living Resources (OSNLR), Training, Education and Mutual Assistance (TEMA), Global Sea-Level Observing System (GLOSS), World Climate Research Programme (WCRP), International Geosphere-Biosphere Programme (IGBP), Land-Ocean Interacrions in the Coastal Zone (LOICZ), Global Ocean Ecosystem Dynamics (GLOBEC), Inter-American Institute for Global Change Research (IAI), Programa Regional para o Oceano Atlântico Sul Ocidental Superior (ASOS), Train-Sea-Coast, Ocean Science in Relation to Living Resources (OSLR), Harmful Algal Blooms (HAB), Climate Variability and Predictability (CLIVAR), Tropical Ocean Global Atmosphere (TOGA), World Ocean Circulation Experiment (WOCE) e Scientific Committee on Oceanic Research (SCOR).
6 - RECURSOS DO MAR
São considerados recursos do mar todos aqueles recursos vivos e não-vivos que se encontram na coluna d'água, no solo e subsolo marinhos, bem como nas áreas costeiras adjacentes, cuja explotação sustentável é relevante sob os pontos de vista econômico, social e ecológico.
É condição fundamental para a correta utilização dos recursos do mar, que se disponham de conhecimentos globais e integrados sobre os elementos que compõem os diversos ecossistemas, bem como sobre as relações antrópicas que os modificam.
Para o V PSRM, foram considerados os recursos vivos e não-vivos.
6.1 - RECURSOS VIVOS
É relevante destacar que a importância dos recursos vivos do mar advém não apenas de sua explotação com a finalidade de produção de alimentos, sob enfoque de recursos pesqueiros, mas também de sua biodiversidade, enquanto patrimônio genético, e como fonte potencial para a utilização na biotecnologia. Em comparação com os ecossistemas terrestres, os ecossistemas marinhos são maiores, mais antigos e abrigam quase o dobro de filos animais, além de exercerem uma enorme influência sobre o clima do planeta.
O problema da utilização dos recursos vivos deve ser abordado a partir de uma visão integrada, lembrando que esses recursos fazem parte de um sistema produtivo complexo, com componentes bióticos e abióticos de alto dinamismo. É imperativo, portanto, que se tenha presente o papel diversificado e relevante de todos os componentes do sistema.
Pelas características inerentes às biotas tropicais e subtropicais, com alta diversidade de espécies e baixas biomassas, o estudo dos ecossistemas e as estimativas de potencial máximo sustentável tornam-se extremamente complexos. No caso de recursos multiespecíficos, a captura dirigida para uma determinada espécie sempre atua sobre as demais. Assim, é imprescindível manter o equilíbrio do estoque específico e do ecossistema como um todo.
Dentro deste enfoque, foi priorizada a implementação, no âmbito da CIRM, a partir de 1994, do Programa de Avaliação do Potencial Sustentável de Recursos Vivos na Zona Econômica Exclusiva - (REVIZEE); visando a atingir as seguintes metas:
- inventariar os recursos vivos na ZEE e as características ambientais de sua ocorrência;
- determinar suas biomassas; e
- estabelecer os potenciais sustentáveis de captura.
A degradação generalizada dos ecossistemas costeiros tem causado graves prejuízos às espécies aquáticas, principalmente nas áreas de berçário, comumente localizadas nas regiões estuarinas.
Os estuários, por constituírem uma zona de transição entre as águas continentais e marinhas, são as regiões mais duramente atingidas pelas ações antópicas. A especulação imobiliária e a conseqüente ocupação desordenada das áreas litorâneas têm resultado, por exemplo, na destruição, por meio de desmatamentos e aterros, de manguezais, os quais constituem ecossistemas essenciais ao ciclo de vida de inúmeras espécies, além de exercerem um papel fundamental no enriquecimento dos ecossistemas costeiros. Além disso, localizam-se nos espaços estuarinos a maioria dos portos brasileiros e alguns dos grandes complexos urbanos e industriais do país. Por último, os estuários ainda representam o espaço natural para atuações integradas entre a gestão costeira e o planejamento de bacias hidrográficas.
A redução das descargas fluviais, por outro lado, resultante tanto do desmatamento, como de variações climáticas de escala global (El Niño e estiagem prolongada), além da construção de barragens, têm contribuído de forma significativa para a redução no aporte de nutrientes para esses ecossistemas.
Outra conseqüência importante tem sido o desmantelamento de comunidades pesqueiras, as quais são obrigadas a mudar de residência e, muitas vezes, de atividade, com resultante evasão de mão-de-obra capacitada para a atividade pesqueira.
Em resumo, os processos de deterioração da qualidade ambiental da zona costeira e marinha, principalmente; (1) a ocupação desordenada; (2) a supressão de vegetação nativa; (3) a contaminação de corpos d'água; e (4) a sobrexplotação dos recursos ambientais, vêm afetando sobremaneira os recursos naturais nessas áreas. Os ecossistemas mais frágeis e complexos, como os manguezais, recifes de coral e estuários, sofrem alterações estruturais, muitas delas irreversíveis, afetando de forma direta e indireta o potencial de geração de conhecimento e benefícios ambientais, econômicos e sociais. Portanto, o conhecimento e o controle dos processos de ocupação dos espaços litorâneos aparecem como pressupostos para uma adequada gestão dos recursos do mar.
O Governo Brasileiro tem dado especial atenção ao uso sustentável dos recursos costeiros. Tal atenção expressa-se no compromisso governamental com o planejamento integrado da utilização de tais recursos, visando o ordenamento da ocupação dos espaços litorâneos. Para atingir tal objetivo, foi implantado o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC), instituído pela Lei nº 7.661/88, com a finalidade primordial de estabelecer normas gerais visando a gestão ambiental da Zona Costeira (ZC) do País, lançando as bases para a formulação de políticas, planos e programas estaduais e municipais.
Considerando o disposto no PNGC, foi elaborado o Plano de Ação Federal da ZC que estabelece metas e ações prioritárias para a constituição de uma ação integrada na esfera pública federal nessa ZC, articulado, também, com estados e municípios, de forma a harmonizar os interesses e as intervenções das diversas esferas de governo.
A utilização dos recursos vivos do mar como fonte de alimentos, objeto da atividade pesqueira, tem ocorrido, ao longo de sua história, de forma desordenada e mal planejada. Como conseqüência, grande parte dos estoques pesqueiros marinhos encontra-se atualmente em situação de evidente sobrepesca. Em função do declínio da produtividade, o setor pesqueiro vem enfrentando uma grave crise econômica e social.
A insuficiência de dados estatísticos consistentes se constitui, atualmente, em grave problema para o país, dificultando sobremaneira o diagnóstico adequado da real condição dos estoques e do próprio processo de sua explotação. As medidas de ordenamento adotadas esbarraram, freqüentemente, em dificuldades para a sua efetiva implementação, em função das precárias condições de fiscalização e controle, seja por problemas estruturais, seja, em muitos casos, por falta de vontade política.
No sentido de incrementar a produção pesqueira nacional, é importante a identificação de estoques ainda subexplotados, notadamente os grandes peixes pelágicos, assim como a introdução de tecnologias apropriadas, que permitam a diversificação das capturas. Contudo, além das barreiras tecnológicas, uma desejável diversificação da atividade pesqueira é obstada, também, pela obsolescência da frota pesqueira nacional. A construção de novos barcos, por sua vez, é dificultada em função dos custos elevados, particularmente se considerada a situação de descapitalização em que se encontra a maioria das empresas de pesca no país. Além disso, barcos obsoletos implicam um custo mais alto de manutenção, o qual se soma aos já elevados custos de produção.
A carência de informações oceanográficas e biológicas que subsidiem a pesca e o conhecimento limitado acerca do potencial dos estoques são dificuldades adicionais a serem superadas pelo setor pesqueiro nacional no caminho do seu desenvolvimento. No caso da pesca oceânica, além das limitações tecnológicas e de pessoal capacitado, o crescimento da atividade é inibido, também, pela dificuldade de competição com as frotas internacionais, reforçada pelas limitações de captura impostas por acordos internacionais, por meio do estabelecimento de cotas. A elevada dependência dos mercados importadores estrangeiros, em muitos casos, torna a indústria brasileira ainda mais vulnerável, já tendo sido, inclusive, alvo de sanções comerciais, como, por exemplo, o embargo por parte de grandes mercados consumidores a produtos nacionais.
Além da precária condição de muitos estoques, sob intenso esforço de pesca, métodos inadequados de manuseio, beneficiamento, conservação e transporte contribuem para reduzir drasticamente a qualidade do pescado. Isto ocorre tanto a bordo como ao longo do trajeto produtor-consumidor, elevando o índice de perdas e reduzindo, conseqüentemente, o seu valor. Quando se considera o problema da fauna acompanhante, particularmente na pesca de arrasto, a captura e descarte a bordo de exemplares pequenos de peixes de importância comercial e de peixes maiores de menor valor atingem patamares alarmantes. As condições precárias de armazenamento, beneficiamento e transporte favorecem a ação predatória de intermediários. Tecnologia para a solução desses problemas está disponível e deve ser aplicada.
O desenvolvimento do setor pesqueiro nacional depende da capacitação de recursos humanos, de forma a abranger todos os elos da cadeia produtiva. A sustentabilidade da atividade depende intrinsecamente de uma mudança de mentalidade do setor pesqueiro, a qual só poderá ocorrer a partir de um grande esforço de conscientização e educação ambiental.
Os problemas anteriormente apontados demonstram a necessidade de uma reestruturação do segmento pesqueiro nacional, cujo soerguimento deverá ocorrer de modo sustentável, sendo, para tanto, imprescindível um planejamento integrado, participativo e co-responsável em consonância com as principais tendências mundiais.
Neste sentido, foi elaborado pelo Grupo-Executivo do Setor Pesqueiro (GESPE) e encaminhado para a elevada apreciação da Casa Civil da Presidência da República, uma proposta de Política Nacional de Pesca e Aquicultura, e do seu instrumento de execução, o Plano Diretor, a fim de atender às demandas do referido setor.
6.2 - RECURSOS NÃO-VIVOS
Os recursos minerais marinhos de águas rasas, economicamente os mais importantes da plataforma continental brasileira, são representados pelos granulados, constituídos pelas areias, cascalhos, pláceres, fosfatos e sedimentos carbonáticos.
A exploração de petróleo e gás em águas jurisdicionais brasileiras tem obtido êxito notável, com a produção petrolífera própria já suprindo considerável parte da demanda do País. Além disto, o Brasil detém auto-suficiência em tecnologia de ponta, que viabiliza a explotação destes recursos também no exterior. Outro recurso mineral energético que apresenta condições de explotação é o carvão.
Ocorrências de substâncias dissolvidas na água do mar, como cloreto de sódio, bromo, magnésio, cálcio, potássio e boro, têm sido exploradas economicamente. Existem, também, experiências de aproveitamento do "screening" mineral em suspensão nas águas marinhas de zonas de ressurgência para a produção de concentrados minerais, que vêm sendo utilizados na agropecuária e na suplementação alimentar humana. Por outro lado, têm sido desenvolvidas, também, experiências no litoral do Espírito Santo, de aproveitamento de algas calcáreas, também para fins agropecuários.
As fontes de energia alternativa, tais como marés, ondas e gradientes térmicos, apresentam boas possibilidades de aproveitamento. Para tanto, são necessárias iniciativas no sentido de estimular propostas tecnológicas que fomentem investimentos no setor.
Os granulados marinhos, tendo sido objeto de pesquisa durante vários anos e apresentando grande valor econômico, poderão ser explotados a curto prazo.
A exploração e a explotação de recursos minerais, sem estudos prévios de impacto ambiental, pode causar danos aos ecossistemas, bem como gerar conflitos de usos com outras atividades, como, por exemplo, a pesca, a navegação, a expansão urbana e o turismo.
O conhecimento geológico sobre a margem continental brasileira é, ainda, insuficiente para a formulação de um programa dirigido à prospecção e à pesquisa de recursos minerais, à exceção dos hidrocarbonetos. Somente a partir de levantamentos geológicos e geofísicos, em escala adequada, será possível avaliar a potencialidade da plataforma continental brasileira.
Tendo em vista a necessidade desses levantamentos, o IV PSRM estabeleceu, como uma de suas diretrizes, a avaliação da potencialidade mineral da Plataforma Continental, que busca assegurar o permanente conhecimento dos recursos minerais com vistas ao seu futuro aproveitamento, estimulando, desse modo, um processo ordenado de decisões e ações, a fim de garantir um desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, foi instituído, no âmbito da CIRM, o Programa de Avaliação da Potencialidade Mineral da Plataforma Continental Jurídica Brasileira (REMPLAC).
Assim, o V PSRM dará prioridade a este novo Programa, de modo a permitir a sua implementação dentro da realidade enfrentada no seu período de vigência.
No mar profundo encontram-se, ainda, os nódulos polimetálicos, sulfetos polimetálicos, e crostas manganesíferas, importantes pelos teores de cobre, níquel, cobalto, manganês e outros elementos de valor econômico. Ressalte-se, ainda, a presença de hidratos de gás, que poderão vir a ser utilizados como fonte energética.
É oportuno salientar que a CNUDM introduziu o conceito de patrimônio comum da humanidade, para o leito do mar, grandes fundos marinhos e o seu subsolo, situados além dos limites da jurisdição nacional, região denominada de "Área", da qual os recursos minerais pertencem à humanidade como um todo, e criou a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos, que é a entidade por intermédio da qual os Estados Partes organizam e controlam as atividades na Área.
De acordo com a CNUDM, os países podem requisitar zonas de mineração na Área, de modo a garantir, no futuro, títulos de mineração exclusiva, dentro do patrimônio comum da humanidade.
Tendo em vista que esse processo somente garantirá acesso às atividades de mineração na Área aos países que tenham efetuado prévias requisições, é altamente recomendável que o governo brasileiro considere, na atualidade, a possibilidade de requisitar, isoladamente ou em "joint venture"com outros países, zonas de exploração de recursos minerais nos fundos marinhos da Área, nas regiões marítimas de seu interesse, de modo a permitir o direito de explorar esses recursos no futuro.
7 - ESTRATÉGIAS DE AÇÃO
7.1 - PESQUISAS PRIORITÁRIAS
7.1.1 - AVALIAÇÃO DO POTENCIAL SUSTENTÁVEL DOS RECURSOS VIVOS
É necessário dar continuidade ao Programa de Avaliação do Potencial Sustentável de Recursos Vivos na Zona Econômica Exclusiva (REVIZEE). O REVIZEE origina-se a partir de duas linhas básicas de motivação. A primeira decorre do compromisso assumido pelo Brasil quando da ratificação da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, que atribui aos países costeiros direitos e responsabilidades quanto à exploração, conservação e gestão dos recursos vivos nas suas ZEE. A segunda linha de motivação tem origem na própria dinâmica interna e na evolução da atividade pesqueira nacional. O REVIZEE, com a identificação de novos estoques e a abertura de uma nova fronteira para a pesca no País, constituída pelas áreas mais afastadas da ZEE, contribuirá para diversificação da atividade pesqueira. Os trabalhos de avaliação de estoques deverão considerar a necessidade de serem obtidas informações sobre genética populacional, correlacionando-as às características ambientais de ocorrência dos mesmos.
Esforço semelhante, para levantamento dos potenciais sustentáveis dos recursos vivos no mar territorial e estuários, baías e enseadas, estoques predominantemente utilizados na pesca artesanal, também adquire prioridade no V PSRM,em consonância com as iniciativas de ordenamento de usos da zona costeira, contempladas no Programa Nacional de Gerenciamento Costeiro.
7.1.2 - RECURSOS PESQUEIROS
Pesquisas relacionadas ao uso eficiente e sustentável dos recursos pesqueiros devem ser desenvolvidas de forma a abranger todos os elos da cadeia produtiva, incluindo:
a) Avaliação e manejo dos recursos pesqueiros tradicionais
Para o gerenciamento adequado da sua explotação são necessárias estimativas de potencial de produção e/ou biomassa. Portanto, deve ser incentivado o uso de modelos de dinâmica populacional que permitam a obtenção das estimativas necessárias. Análises das incertezas das previsões dos modelos devem ser também realizadas;
b - Identificação dos novos recursos
Como as pesquisas de prospecção e identificação de novos recursos pesqueiros já estão inseridas no contexto do Programa REVIZEE, esforços adicionais devem ser desenvolvidos no sentido de adaptar novas tecnologias de captura ao setor pesqueiro nacional, de forma a permitir a explotação de estoques ainda subutilizados. Deve-se buscar, também, o aperfeiçoamento dos aparelhos de captura atualmente empregados, no sentido de torná-los mais seletivos, aumentando a sua eficácia e reduzindo a participação da fauna acompanhante nas capturas. Tais esforços, por sua vez, terão impacto direto na redução dos conflitos atualmente existentes entre a pesca industrial e a artesanal, criando alternativas para os dois segmentos. Por outro lado, é fundamental o estabelecimento de estratégias objetivas para garantir a aplicação das novas informações obtidas pela pesquisa no fomento e ordenamento pesqueiro possibilitará retorno constante ao setor de pesquisa, permitindo o direcionamento de esforços e o incremento da integração público-privada no desenvolvimento deste setor.
c) Aspectos sócio-econômicos
Na área de tecnologia do pescado, devem ser desenvolvidos trabalhos que promovam o aprimoramento dos métodos de manuseio, conservação e processamento, a bordo e em terra, e a redução das perdas, de forma a permitir uma maior valorização do pescado. A nível industrial, deve ser incentivada a adoção de programas de Análise de Riscos e Controle de Pontos Críticos (ARCPC) pelas empresas brasileiras, condição essencial à manutenção da competitividade internacional.No caso da introdução de novas tecnologias de captura, estudos de impactos sobre os ecossistemas assim como estudos de mercado devem ser efetuados no sentido de garantir a comercialização de novas espécies eventualmente capturadas, a preços competitivos, uma vez que as mesmas, em muitos casos, podem ser completamente desconhecidas dos consumidores locais.
Na comercialização do pescado capturado, esforços devem ser desenvolvidos na obtenção de mecanismos que permitam encurtar a distância entre o produtor e o consumidor, garantindo preço satisfatório para ambos, além de melhor qualidade do produto comercializado e maior garantia de escoamento da produção. Em termos comparativos, os avanços no sistema de comercialização podem, em muitos casos, reverter em ganhos significativos para o produtor, com aplicabilidade muito mais fácil e imediata, além de custo muito menor, quando comparado a investimentos no sentido de aumentar os índices de captura, normalmente já bastante próximos de seu limite máximo.
O processo de distribuição deve ser analisado, em todas as suas etapas, objetivando detectar os pontos de estrangulamento em relação aos aspectos sociais, econômicos e culturais. Recomenda-se, ainda, estimular o resgate, sistematização e aperfeiçoamento de artes de pesca tradicionais.
Iniciativas devem ser tomadas, também, no sentido de elevar a economicidade da atividade pesqueira, através de sistemas mais eficientes de administração, redução dos custos operacionais e de insumos, além de organização associativista; e
d) Maricultura
A maricultura, por sua vez, é uma alternativa capaz de trazer importante contribuição para o incremento da produção pesqueira nacional. Em ambientes naturais, contudo, não pode ser desvinculada de avaliações da potencialidade dos ecossistemas costeiros, em seus vários níveis tróficos, sendo imprescindível a realização de trabalhos sobre a auto-ecologia das espécies e das populações, identificando as exigências de cada uma quanto às condições para reprodução, alimentação e crescimento. A viabilização da maricultura, em escala nacional, não pode se dar fora do contexto do gerenciamento costeiro e da avaliação de seus impactos ambientais, derivados da poluição, da degradação dos ecossistemas naturais e do perigo potencial de introdução de espécies exógenas ou geneticamente modificadas. Deve-se ter grande cautela, também, nas interações potenciais de projetos de maricultura com outras atividades tradicionais de extrativismo costeiro, incluindo as suas repercussões sócio-econômicas. Estudos visando ao repovoamento de estoques exauridos devem também ser estimulados.
Faz-se necessário apoiar ações que viabilizem a aplicação de novas tecnologias para o manejo sustentado dos recursos pesqueiros. Particularmente, o uso de atratores e recifes artificiais servem como ferramentas para o incremento da pesca e proteção do assoalho marinho. Complementarmente a esta estratégia, o conceito de reservas marinhas como santuários ecológicos também se aplica adequadamente na proteção de "habitat" específicos para larvas e juvenis garantindo o recrutamento, a manutenção dos estoques e da biodiversidade.
7.1.3 - AVALIAÇÃO DA POTENCIALIDADE MINERAL DA PLATAFORMA CONTINENTAL
De acordo com a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), ratificada pelo Brasil em 1988, foram assumidos compromissos e deveres, entre os quais a delimitação da Plataforma Continental Jurídica (PCJ), sendo, então, criado o Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira (LEPLAC), pela CIRM, em 07/03/88.
No IV PSRM foi recomendada a avaliação da potencialidade mineral da plataforma continental para dar continuidade aos levantamentos sistemáticos anteriores desenvolvidos pelas Operações GEOMAR, pelo Programa de Reconhecimento Global da Margem Continental Brasileira (REMAC), pelos diversos levantamentos efetuados no âmbito do Programa de Geologia e Geofísica Marinha (PGGM), pelo LEPLAC e pelo Programa "Ocean Science in Relation to Non-Living Resources" (OSNLR), da Comissão Oceanográfica Intergovernamental (COI).
Para o cumprimento desta tarefa, foi criado, no âmbito da CIRM, o Programa de Avaliação da Potencialidade Mineral da Plataforma Continental Jurídica Brasileira (REMPLAC). Nesse Programa será efetuado o levantamento sistemático geológico-geofísico básico da Plataforma Continental Jurídica Brasileira (PCJB) e em sítios de interesse geoeconômico-ambiental, serão realizados em escala apropriada.
A análise e a avaliação desses estudos de avaliação dos depósitos minerais fornecerão informações sobre sua potencialidade, bem como sobre os processos atuantes na área. Atenção especial deve ser dada aos recursos que já tenham sido objeto de pesquisa e apresentem interesse econômico. Ressalta-se a necessidade de atualização e adequação da legislação brasileira referente à pesquisa e explotação dos recursos minerais ocorrentes na PCJB.
7.1.4 - PROCESSOS FÍSICOS, QUÍMICOS, GEOLÓGICOS E BIOLÓGICOS: OCEÂNICOS E COSTEIROS
Estudos integrados dos processos físicos, químicos, geológicos e biológicos contribuem para um melhor entendimento dos ecossistemas marinhos.
A distribuição das propriedades físicas e da circulação da água do mar, resultante da dinâmica dos processos de interação oceano-atmosfera-continente, são os componentes fundamentais para o desenvolvimento e implementação de modelos matemáticos de ecossistemas marinhos. Portanto, é essencial que se incentive a continuidade e o aprimoramento dos estudos desses processos.
Estudos sinóticos para a avaliação dos processos costeiros e oceânicos deverão ser realizados, visando ao entendimento dos mecanismos de troca de massas de água da plataforma continental com as regiões costeiras e talude, e ao cálculo dos fluxos de calor e dos materiais dissolvidos e em suspensão na água do mar.
Dentre esses mecanismos, podem ser mencionados os meandros e os vórtices das correntes marinhas da costa brasileira (Corrente Norte do Brasil e Corrente do Brasil) e fenômenos de ressurgência, os quais produzem alterações na concentração dos nutrientes, com importantes conseqüências para o desenvolvimento e comportamento das comunidades biológicas.
Os resultados desses estudos são igualmente importantes para um melhor conhecimento climático, fornecendo dados para a previsão meteorológica e climática sobre o território brasileiro. Esses dados são, também, necessários para a compreensão dos processos atuais de sedimentação marinha, transporte e retrabalhamento de sedimentos de fundo, e transporte de materiais em suspensão.
A Oceanografia Química apresenta várias possibilidades de atuação intimamente ligadas aos recursos do mar, destacando-se: levantamento de dados básicos oceanográficos indispensáveis à compreensão de processos biológicos (pH, pCO2, alcalinidade, concentração de nutrientes, concentração de pigmentos algais, produtividade primária, concentração de O2) e de outras áreas de interesse; caracterização de massas de água, utilizando traçadores químicos e determinação de fluxos materiais; identificação e dimensionamento de fontes de espécies químicas, tais como aquelas provenientes do aporte continental ou de ressurgência, visando a estudos de balanço de massa; avaliação da contaminação e da poluição dos ecossistemas costeiros e oceânicos; avaliação dos processos biogeo-químicos; avaliação do potencial de transferência de poluentes para a teia alimentar; verificação da qualidade de recursos vivos, capturados ou cultivados, e produtos elaborados visando ao consumo humano; e participação nos estudos de prospecção e pesquisa de recursos minerais, principalmente na avaliação (quantitativa e qualitativa).
Considera-se importante uma ação integrada da química com as demais áreas, não só nos projetos oceanográficos e de ecossistemas, mas também naqueles de maricultura. Aqui o balanço de materiais, a otimização de meios de cultivo e outras atividades contribuirão para a viabilização técnico-científica, ecológica e econômica dessas atividades. O estudo de processos químicos não deve se reduzir a atividades acessórias, devendo estar integrado aos estudos físicos, geológicos e biológicos.
A distribuição dos sedimentos da plataforma continental brasileira reflete os processos sedimentares atuantes. A composição dos sedimentos da plataforma depende, em parte, do material fornecido pelo continente, especialmente através dos rios e da contribuição orgânica. A distribuição granulométrica destas partículas está intimamente relacionada à interação de vários fatores, principalmente as condições hidrodinâmicas, relevo de fundo e fatores físico-químicos. A determinação da composição textural dos sedimentos e das necessidades carbonáticas (bióticas) é de grande utilidade na descrição e interpretação das fácies e dos processos sedimentares que ocorrem na plataforma continental. A compreensão dos processos costeiros e seus efeitos no balanço sedimentar constitui um elemento de fundamental importância para a identificação da evolução da linha de costa, com aplicação direta nas políticas e ações de ordenamento da ocupação costeira, em especial, na prevenção e controle dos processos erosivos.
Do ponto de vista biológico, os processos de produção primária, tanto fitoplanctônica como fitobentônica, basicamente controlados pela disponibilidade de sais nutrientes e luz, além de outros fatores físicos, como turbulência e sedimentação, constituem a base da cadeia trófica, possuindo, portanto, imensa importância para a vida nos oceanos. O conhecimento dos mecanismos de interação entre os processos de produção primária e os processos físicos e químicos, incluindo a sua variabilidade espaço-temporal, constitui um dos elementos fundamentais para a compreensão integrada da dinâmica dos ecossistemas marinhos, sendo, o mesmo, um dos componentes principais, inclusive, para o desenvolvimento de modelos matemáticos. Além dos processos de produção primária, diversos processos biológicos possuem, também, grande relevância como, por exemplo, os processos de recrutamento e de fluxo de energia através da cadeia trófica.
7.1.5 - ESTUDO INTEGRADO DOS ECOSSISTEMAS OCEÂNICOS E COSTEIROS
A compreensão integrada dos ecossistemas oceânicos e costeiros, em termos estruturais e funcionais, é de grande relevância, não apenas para permitir um aproveitamento racional dos seus recursos vivos (tanto em termos extrativos como de cultivo) e não-vivos, como para subsidiar um manejo adequado dos mesmos, de forma a garantir a manutenção de seu equilíbrio e a preservação de sua biodiversidade. A análise integrada deve incluir o levantamento das informações abióticas e bióticas, com particular ênfase nos processos de enriquecimento e reciclagem de nutrientes, recrutamento, interações tróficas e fluxos de energia.
Ecossistemas bem delimitados geograficamente, com baixo comprometimento ambiental e influência antrópica ainda relativamente reduzida, como é o caso de ilhas e bancos oceânicos, devem ser estudados em maior profundidade. Esses ecossistemas insulares apresentam comumente um elevado grau de endemismo e grande biodiversidade (compreendendo-se, por este termo, mais do que a simples diversidade de espécies, a diversidade genética), características estas que conferem aos mesmos uma acentuada fragilidade e marcante importância ecológica. O desenvolvimento desse tipo de pesquisa é particularmente desejável em programas de pesquisa, como o PROARQUIPÉLAGO, desenvolvido pela CIRM, no Arquipélago de São Pedro e São Paulo.
No que tange aos ecossistemas costeiros, particular ênfase deve ser colocada nos ecossistemas estuarinos e de manguezais, lagunas, bancos de algas calcárias e recifes coralinos, não apenas em função de sua importância ecológica, econômica e social, mas, também, em função de sua vulnerabilidade às ações antrópicas. Tais ações deverão se acentuar, cada vez mais, a partir da intensificação da ocupação humana da faixa litorânea e do desenvolvimento de atividades impactantes.
Assim sendo, devem ser estimulados estudos integrados tanto de ecossistemas, com um mínimo de comprometimento ambiental, como em outros já altamente comprometidos, de forma a viabilizar análises comparativas.
Da mesma forma, é necessária, também, uma integração permanente entre o Plano Setorial para os Recursos do Mar - PSRM e o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro - PNGC, para garantir uma concatenação adequada entre os instrumentos de investigação e os de gestão, a fim de assegurar a proteção e o uso sustentável da biodiversidade costeira e marinha.
7.1.6 - ESTUDO E MONITORAMENTO OCEANOGRÁFICO E CLIMATOLÓGICO EM ESCALA GLOBAL
É necessário entender a interação entre os diferentes componentes do sistema climático, em particular, do oceano e da atmosfera. Essas interações, no Oceano Pacífico, são responsáveis pela ocorrência aperiódica do fenômeno El Niño-Oscilação Sul, alterando as condições físico-biogeoquímicas e, conseqüentemente, afetando os ecossistemas marinhos. No Atlântico Tropical, a variabilidade sazonal e decadal, associada ao deslocamento anômalo da Zona de Convergência Intertropical, tem influência direta no clima regional do Brasil. No Atlântico Sul, variações da temperatura de superfície do mar, associadas às variações latitudinais da região de confluência entre a Corrente do Brasil e a Corrente das Malvinas, podem estar associadas a anomalias na produtividade da cadeia trófica.
Devem ser incentivados os programas de monitoramento, de coleta de dados operacionais e de modelagem matemática numérica dos processos de interação oceano-atmosfera. O objetivo desse incentivo é possibilitar, no futuro, a previsão dos eventos climáticos que possam afetar os recursos marinhos. Nesse aspecto, a cooperação internacional é importante, pois os estudos devem ter caráter global.
O mecanismo para efetuar o monitoramento em escala mundial é o Sistema de Observação Global dos Oceanos - GOOS (Global Ocean Observing System), já adotado em nosso País, sob a forma de um Programa Piloto, aprovado pela CIRM, cuja duração está prevista até o ano 2007, quando espera-se que seja implantado definitivamente. Este sistema é oriundo da necessidade de se implementar, sistematizar e tornar plenamente operacional a coleta, a análise e a transmissão de dados em toda a área oceânica em relação à qual o Brasil exerce direitos de soberania e jurisdição, gerando-se produtos de impacto sócio-econômico para o País.
O Plano de Implementação do GOOS define cinco módulos principais:
- avaliação, previsão e monitoramento do clima;
- avaliação e monitoramento dos recursos vivos marinhos;
- monitoramento e gerenciamento de zonas costeiras;
- avaliação e previsão da saúde dos oceanos; e
- serviços meteorológicos marinhos e operacionais em oceanografia.
Como parte integrante do Programa Piloto GOOS/Brasil, existe o Programa Nacional de Bóias que visa a coletar dados oceanográficos e meteorológicos em tempo quase real, a fim de atender às necessidades de caracterização do meio ambiente e prover informações concernentes à segurança da navegação nas áreas marítimas sob a responsabilidade do Brasil, para efeitos de previsão meteorológica marinha e salvaguarda da vida humana no mar.
Os dados coletados, tanto pelo Programa Piloto GOOS/Brasil como pelo Programa Nacional de Bóias, serão operacionalizados e disponibilizados à comunidade usuária, aos cientistas, aos órgãos governamentais, aos institutos de pesquisas, entre outros, por meio de redes internacionais, via satélite, já existentes no mundo.
7.1.7 - BIODIVERSIDADE E BIOTECNOLOGIA
A importância da biodiversidade, seja como indicativo da saúde ambiental ou como elemento chave para o funcionamento dos ecossistemas, é, hoje, amplamente reconhecida. Uma composição flexível em termos de biodiversidade, contribuindo em ciclos alternados para a composição majoritária da biomassa total, pode ser uma garantia de estabilidade funcional para os ecossistemas. Assim, em muitos sistemas, uma alteração na composição específica, que possa afetar seus processos de regulação, pode alterar tanto sua dinâmica quanto seu "valor". Tem sido cada vez mais comum a observação de ecossistemas em desequilíbrio, como resultado da ação humana, com a dominância de espécies de menor valor comercial, ocupando os nichos liberados por espécies sobrexplotadas, ou mais sensíveis à degradação ambiental.
O item 15.3 do Capítulo 15 da Agenda 21 aborda a questão, enfatizando a necessidade do melhor conhecimento da biodiversidade, como pré-condição para seu uso sustentável.
Os objetivos da Convenção sobre Diversidade Biológica, resultado da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) - Rio 92, ratificada pelo Brasil em fevereiro de 1994, abrangem três aspectos de fundamental relevância: a proteção da diversidade biológica, a utilização sustentável dos ecossistemas e a repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos. No que se refere ao meio ambiente marinho, a Convenção estabelece que seus dispositivos devem ser implementados em conformidade com os direitos e obrigações dos Estados decorrentes da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar.
A capacidade de aferir, estudar, observar sistematicamente e avaliar a diversidade biológica precisa ser reforçada no plano nacional e no plano internacional. Assim sendo, é preciso que se adotem ações nacionais eficazes, e, ao mesmo tempo, que se estabeleça a cooperação internacional para a proteção dos ecossistemas, para a conservação dos recursos biológicos e genéticos. A participação e o apoio das comunidades locais são elementos essenciais para o sucesso de tal abordagem.
Os progressos realizados, recentemente, no campo da biotecnologia apontam o provável potencial do material genético contido nas plantas, nos animais e nos microorganismos para a agricultura, a saúde, o bem-estar e para fins ambientais.
A despeito de sua importância como reguladora do equilíbrio dos ecossistemas, o foco principal de interesse sobre a biodiversidade se deve ao seu potencial como fonte de recursos biotecnológicos, para as indústrias química e farmacêutica. O ambiente marinho vem se configurando como um reservatório excepcional de produtos naturais bioativos, muitos dos quais exibem características estruturais não encontráveis no ambiente terrestre.
A aplicação tecnológica da biodiversidade está dirigida para a coleta, identificação e isolamento desses compostos com técnicas sofisticadas, de farmacologia bioquímica e molecular. Exemplos da aplicação tecnológica marinha são: (I) a manipulação genética, com grande aplicação na maricultura, principalmente no que diz respeito à introdução e adaptação de espécies exóticas, desde que não interfiram na estrutura das comunidades naturais; (II) a extração de polissacarídeos algais para a indústria de alimentos, fármacos e cosméticos; (III) a extração de substâncias importantes na medicina (anticancerígenos, antibióticos, e etc) e de substâncias antiincrustrantes para a indústria naval e obras costeiras; e (IV) a mitigação do efeito de biotoxinas (p.ex., bloom de algas nocivas) em sistemas de cultivo, etc.
Tendo em vista a vulnerabilidade dos ecossistemas ao impacto antropogênico regional e global, é fundamental fomentar ações que preservem o patrimônio genético, garantindo o potencial biotecnológico das comunidades marinhas. Ademais, é necessário adequar a legislação nacional, de modo a disciplinar o controle e o acesso ao patrimônio genético do País, inclusive nas áreas marinhas sob jurisdição do Brasil.
7.2 - UNIDADES DE CONSERVAÇÃO COSTEIRA E MARINHA
As unidades de conservação são instrumentos estratégicos indispensáveis para a conservação da biodiversidade, para a regulação do uso e ocupação dos espaços na zona costeira e marinha, e para a manutenção da base genética das espécies exploradas fora destas unidades. Distribuídas por todo litoral brasileiro e abarcando quase a totalidade das ilhas oceânicas do país, devem ser consideradas no V PSRM, principalmente em relação aos seguintes aspectos:
- análise da representatividade ecológica do conjunto das unidades de conservação em relação aos ecossistemas e macroprocessos existentes na zona costeira e marinha;
- utilização das unidades de conservação como pontos privilegiados para o desenvolvimento de uma rede de monitoramento ambiental e de experimentos que demandem uma proteção em relação às ações antrópicas diretas;
- utilização das categorias de uso direto, principalmente áreas de proteção ambiental (APA's) e reservas extrativistas (RESEX's) para experiência-piloto de ordenamento pesqueiro e dos processos de ocupação; e
- exploração mais ampla das unidades de conservação como pontos-núcleo de disseminação de conceitos de conservação, uso sustentável de recursos naturais, educação, mobilização ambiental e mentalidade marítima.
7.3 - DADOS E INFORMAÇÕES
7.3.1 - COLETA DE DADOS
7.3.1.1 - EMBARCAÇÕES DE PESQUISA
Diante das evidências dos entraves causados ao desenvolvimento dos estudos do mar pela inadequação da frota de pesquisa, é necessária a formação de um programa nacional de gerenciamento e manutenção de embarcações e tripulações, que atenda às características de pesquisas nas áreas costeiras, de plataforma e oceânicas.
Deverá ser considerada, também, a modernização, dos equipamentos das embarcações existentes e o apoio à aquisição de embarcações para as instituições de pesquisa. Resta salientar que prejuízos profundos para os programas de pesquisa foram detectados, devido à ausência de embarcações com características específicas para a coleta e processamento de amostras a bordo.
7.3.1.2 - SENSORIAMENTO REMOTO E BÓIAS
Dada a dificuldade de se coletarem dados oceânicos "in situ"com grande cobertura espacial e alta repetitividade, faz-se cada vez mais necessário o uso de técnicas de sensoriamento remoto.
A coleta da dados oceanográficos de superfície sobre extensas áreas e com alta repetitividade temporal apresenta grandes dificuldades logísticas e altos custos. Essa coleta, realizada convencionalmente por navios, pode ser aumentada ou complementada por tecnologia espacial hoje disponível.
Assim, os enlaces de telecomunicações com satélites estão disponíveis para transmitir em tempo real dados oceânicos coletados por bóias de deriva ou ancoradas. Os inúmeros sistemas de satélites em órbita, ou a serem lançados em futuro próximo, permitem a coleta de dados oceânicos em escala regional ou global na escala temporal de dias. Por meio desta tecnologia, hoje é possível, em tempo real, a coleta dos principais dados meteorológicos e oceânicos de superfície. O deslocamento das bóias de deriva fornece, também, informações sobre as correntes de superfície.
Na faixa do espectro visível podem-se extrair informações sobre a produtividade primária na zona eufótica, sobre a concentração de sedimentos ou indicativos de poluição. No espectro infra vermelho termal, os sensores orbitais permitem que mapas de temperatura da superfície do mar e cartas de pesca sejam produzidos na escala temporal de dias.
Mais recentemente, com o lançamento de satélites operando na faixa de microondas, tornou-se possível a coleta de dados de campos de onda, ventos oceânicos, nível do mar e a detecção de poluição por óleo em praticamente qualquer condição meteorológica. A aplicação de técnica de sensoriamento remoto no auxílio à pesca já vem sendo utilizada por parte do setor pesqueiro nacional, através, principalmente, da atuação de empresas privadas. A disponibilização de tais produtos, para o setor pesqueiro ou de pesquisas na área de pesca, deve ser incentivada.
7.3.1.3 - ESTAÇÕES COSTEIRAS
Tendo em vista a importância e a escassez de informações , recomenda-se a coleta de dados oceanográficos e meteorológicos de superfície marinha com estações costeiras e em ilhas oceânicas. Essa coleta implica o monitoramento, detecção e previsão de eventos como tempestades, passagens de frentes e alterações no nível do mar que possam afetar os ecossistemas marinhos.
Os oceanos devem ser monitorados globalmente para melhorar nossa capacidade de detectar e prever os efeitos das mudanças climáticas e a nossa capacidade de executar operações no mar com a máxima eficiência. Atividades nestas áreas devem ser incentivadas devido ao seu alto potencial de contribuição para o PSRM.
7.3.1.4 - ESTATÍSTICA PESQUEIRA
O sistema nacional de estatística pesqueira deve ser fortalecido, de forma a incluir aspectos sócio-econômicos e permitir o levantamento e atualização sistemática das informações relativas ao esforço de pesca e produção desembarcada. Tal sistema é essencial para o diagnóstico e monitoramento dos estoques e do próprio setor pesqueiro, constituindo-se em instrumento essencial para a aplicação de medidas de regulamentação, ordenamento, fomento e desenvolvimento pesqueiros.
Neste contexto, a criação de um banco de dados nacional, de fácil acesso, que gerencie as informações do sistema nacional de estatística (por exemplo, informações de esforço e captura, contidas nos mapas de bordo, dados da estrutura de comprimento da captura desembarcada, etc.) é fundamental, sendo necessário, para isso, o envolvimento do IBGE no atendimento a demandas específicas do setor de planejamento, no que se refere à produção de dados estatísticos básicos.
7.3.2 - INTERCALIBRAÇÃO E PADRONIZAÇÃO
Os programas de intercalibração visam, em última instância, à confiabilidade da metrologia das variáveis oceanográficas. Além disso, permitem uma avaliação crítica das técnicas, métodos e procedimentos analíticos, os quais poderão ser recomendados ou não, com base nos testes de precisão e exatidão analíticas. Os testes de exatidão devem ser realizados, idealmente, com materiais de referência certificados. Como auxílio a essas atividades no Brasil, já existem laboratórios para algumas calibrações e confecção de padrões, que devem ser apoiados no contexto do V PSRM.
7.3.3 - GERENCIAMENTO E DISPONIBILIZAÇÃO DE DADOS E INFORMAÇÕES
Em face do grande volume de dados já existentes e a serem gerados por programas em desenvolvimento ou em fase de implementação, faz-se mister o desenvolvimento de um sistema de informações oceanográficas que possa harmonizar os padrões de coleta e armazenamento de dados, disponibilizar as informações aos usuários, e consolidar as interfaces entre os programas do PSRM e entre estes e outros programas nacionais e internacionais.
O Banco Nacional de Dados Oceanográficos (BNDO), sob a responsabilidade da Diretoria de Hidrografia e Navegação (DHN), é depositário de dados oceanográficos e meteorológicos de importância estratégica para a produção de informações relevantes para pesquisadores e demais usuários dos recursos do mar. Recomenda-se, portanto, o seu fortalecimento e interligação com outros bancos de dados existentes ou que venham a ser criados.
7.4 - FORMAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS
A geração de conhecimentos, que orientem a utilização racional dos recursos do mar, necessita de grupos de especialistas nos vários domínios das ciências marinhas.
A carência de recursos humanos em ciências do mar tem se constituído em fator limitante do desenvolvimento de projetos integrados. Com referência aos programas de graduação e pós-graduação, faz-se necessário valorizar a formação de especialistas nas áreas de Oceanografia Física, Oceanografia Química, Oceanografia Geológica, Biotecnologia e Pesca, a exemplo das ações desenvolvidas pelo programa induzido para a formação de doutores, do CNPq. A identificação de tais necessidades, dentre as quais pode ser incluída a formação de profissionais em taxonomia e sistemática, além de direito ambiental, visa promover uma formação interdisciplinar que enseje uma visão abrangente para respaldar, tecnicamente, o uso, o manejo e a conservação dos recursos.
Mecanismos que possibilitem a qualificação e a absorção de pessoal e a correção de desigualdades regionais deverão ser viabilizados, tais como: cursos de especialização, treinamentos, aproveitamento em grupos emergentes de egressos da pós-graduação, realização de projetos de pesquisa entre grupos de pesquisa emergentes e consolidados e a criação de mecanismos capazes de manter pessoal qualificado junto a projetos apoiados pelo V PSRM. Paralelamente, deverá ser incentivado o desenvolvimento de uma política de absorção de recursos humanos formados pelos programas de fomento.
A formação de pessoal técnico especializado deverá ser estimulada através do desenvolvimento de programas de especialização e aperfeiçoamento nas áreas de acentuada carência, como o cultivo de organismos marinhos e a operação e manutenção de equipamentos.
Nesse sentido, a aguda carência de mão-de-obra capacitada para atender ao setor produtivo constitui um dos principais óbices ao desenvolvimento das atividades ligadas aos recursos do mar. Identificam-se demandas específicas, tanto a nível de setores, quando se trata de incorporação da dimensão da sustentabilidade nessas atividades, o que implica a adoção de novas tecnologias e procedimentos, quanto no que se refere à necessidade da criação de grupos interdisciplinares que possam manejar a informação, de forma integrada, possibilitando o estabelecimento de subsídios ao planejamento e ordenamento dos diversos usos dos recursos.
Especificamente na atividade pesqueira, esta carência de mão-de-obra capacitada também constitui um dos principais óbices ao desenvolvimento do setor pesqueiro nacional, tanto em escala artesanal como industrial. No setor da pesca artesanal, trata-se de solucionar os problemas intrínsecos à atividade, ou seja, a minimização dos aspectos predatórios (sobrepesca, desperdício de pescado); a valorização do saber tradicional; os conflitos com a pesca industrial, turismo e segunda residência; as formas de organização social; o resgate cultural e promoção da educação (erradicação do analfabetismo) e saúde básica; e os mecanismos de beneficiamento e comercialização do pescado.
Um outro ponto de fundamental importância é que a capacitação não deve enfocar um aspecto isolado da atividade pesqueira. Ao contrário, deve ser, preferencialmente, orientada de forma a abranger os diversos elos da cadeia produtiva. É preciso, também, desenvolver uma ação de educação ambiental, de mobilização ecológica e de associativismo, que contribua para a sustentabilidade da atividade a médio e longo prazos.
O Programa "Train-Sea-Coast" Brasil, que integra a rede coordenada pela Divisão de Assuntos Oceânicos e Direito do Mar da ONU-DOALOS ("Division of Ocean Affairs and Law of the Sea"), deve ser aproveitado para aumento da capacidade brasileira de treinamento na área de recursos humanos, em termos de tomadores de decisão, administradores, acadêmicos e da própria comunidade de trabalhadores envolvida nas diversas atividades.
8 - RECURSOS FINANCEIROS E LOGÍSTICOS
Para sua consecução, o V PSRM deverá contar com fontes de recursos nas esferas federal, estadual e municipal, além do concurso de outras iniciativas, no âmbito nacional e internacional, inclusive de ordem privada, que venham a ter comprometimento com as áreas de conhecimento do referido Plano, e que serão consubstanciadas por intermédio do estabelecimento de parcerias, acordos administrativos e demais instrumentos hábeis de cooperação técnico-científica e financeira.
A principal limitação para o desenvolvimento da pesquisa oceanográfica, no Brasil, é a insuficiência de meios flutuantes adequados. As poucas embarcações disponíveis são deficientemente equipadas e não atendem à demanda das instituições de pesquisa. Constata-se, ainda, a falta de recursos materiais e humanos, necessários à sua manutenção e operação. Para melhorar esse quadro é necessário: aquisição de embarcações adequadas e equipadas; financiamento para manutenção e operação das embarcações; estabelecimento de política que atenda às necessidades funcionais da tripulação e pesquisadores; e criação de um centro operacional para a administração e controle da frota.
É importante, também, que se viabilizem mecanismos para a aquisição de equipamentos que permitam a modernização dos laboratórios vocacionados para as ciências do mar, uma vez que a maioria das instituições de pesquisa não dispõe de equipamentos adequados às reais necessidades do PSRM. Esforços devem ser desenvolvidos, ainda, para que os laboratórios e equipamentos existentes sofram manutenção adequada, bem como para calibração de sensores e padronização de metodologias.
9 - ANÁLISE E ACOMPANHAMENTO
A análise e acompanhamento dos programas desenvolvidos no âmbito do V PSRM deverão ser levados a efeito pela Subcomissão para o PSRM, bem como pelos Comitês Executivos dos diversos programas sob a sua égide, buscando a otimização dos resultados a serem alcançados, a utilização eficaz dos recursos disponíveis e uma melhoria constante dos padrões das pesquisas a serem desenvolvidas.
Para tal, devem ser fomentados mecanismos de interação entre as instituições responsáveis pela execução dos programas e a comunidade científica, por meio de reuniões técnicas periódicas, bem como pela utilização de outros instrumentos de avaliação e acompanhamento.