DECRETO Nº 2.661, de 08 de julho de 1998 

Regulamenta o parágrafo único do art. 27 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965 (código florestal), mediante o estabelecimento de normas de precaução relativas ao emprego do fogo em práticas agropastoris e florestais, e dá outras providências

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no parágrafo único do art. 27 da Lei n° 4.771, de 15 de setembro de 1965, e no art. 9º da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981,

DECRETA:

CAPÍTULO I

DA PROIBIÇÃO DO EMPREGO DO FOGO

Art. 1º - É vedado o emprego do fogo:

I - nas florestas e demais formas de vegetação;

II - para queima pura e simples, assim entendida aquela não carbonizável, de:

a) aparas de madeira e resíduos florestais produzidos por serrarias e madeireiras, como forma de descarte desses materiais;

b) material lenhoso, quando seu aproveitamento for economicamente viável;

III - numa faixa de: 

a) quinze metros dos limites das faixas de segurança das linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica;

b) cem metros ao redor da área de domínio de subestação de energia elétrica;

c) vinte e cinco metros ao redor da área de domínio de estações de telecomunicações;

d) cinqüenta metros a partir de aceiro, que deve ser preparado, mantido limpo e não cultivado, de dez metros de largura ao redor das Unidades de Conservação;

e) quinze metros de cada lado de rodovias estaduais e federais e de ferrovias, medidos a partir da faixa de domínio;

IV - no limite da linha que simultaneamente corresponda:

a) à área definida pela circunferência de raio igual a seis mil metros, tendo como ponto de referência o centro geométrico da pista de pouso e decolagem de aeródromos públicos;

b) à área cuja linha perimetral é definida a partir da linha que delimita a área patrimonial de aeródromo público, dela distanciando no mínimo dois mil metros, externamente, em qualquer de seus pontos.

§ 1º - Quando se tratar de aeródromos públicos que operem somente nas condições visuais diurnas (VFR) e a queima se realizar no período noturno compreendido entre o por e o nascer do Sol, será observado apenas o limite de que trata a alínea "b" do inciso IV.

§ 2º - Quando se tratar de aeródromos privados, que operem apenas nas condições visuais diurnas (VFR) e a queima se realizar no período noturno, compreendido entre o por e o nascer do Sol, o limite de que trata a alínea "b" do inciso IV será reduzido para mil metros.

§ 3º - Até 9 de julho de 2003, fica proibido o uso do fogo, mesmo sob a forma de queima controlada, para queima de vegetação contida numa faixa de mil metros de aglomerado urbano de qualquer porte, delimitado a partir do seu centro urbanizado, ou de quinhentos metros a partir do seu perímetro urbano, se superior. (NR)

CAPÍTULO II

DA PERMISSÃO DO EMPREGO DO FOGO

Art. 2º - Observadas as normas e condições estabelecidas por este Decreto, é permitido o emprego do fogo em práticas agropastoris e florestais, mediante Queima Controlada.

Parágrafo único - Considera-se Queima Controlada o emprego do fogo como fator de produção e manejo em atividades agropastoris ou florestais, e para fins de pesquisa científica e tecnológica, em áreas com limites físicos previamente definidos.

Art. 3° - O emprego do fogo mediante Queima Controlada depende de prévia autorização, a ser obtida pelo interessado junto ao órgão do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, com atuação na área onde se realizará a operação.

Art. 4º - Previamente à operação de emprego do fogo, o interessado na obtenção de autorização para Queima Controlada deverá:

I - definir as técnicas, os equipamentos e a mão-de-obra a serem utilizados;

II - fazer o reconhecimento da área e avaliar o material a ser queimado;

III - promover o enleiramento dos resíduos de vegetação, de forma a limitar a ação do fogo;

IV - preparar aceiros de no mínimo três metros de largura, ampliando esta faixa quando as condições ambientais, topográficas, climáticas e o material combustível a determinarem;

V - providenciar pessoal treinado para atuar no local da operação, com equipamentos apropriados ao redor da área, e evitar propagação do fogo fora dos limites estabelecidos;

VI - comunicar formalmente aos confrontantes a intenção de realizar a Queima Controlada, com o esclarecimento de que, oportunamente, e com a antecedência necessária, a operação será confirmada com a indicação da data, hora do início e do local onde será realizada a queima;

VII - prever a realização da queima em dia e horário apropriados, evitando-se os períodos de temperatura mais elevada e respeitando-se as condições dos ventos predominantes no momento da operação;

VIII - providenciar o oportuno acompanhamento de toda a operação de queima, até sua extinção, com vistas à adoção de medidas adequadas de contenção do fogo na área definida para o emprego do fogo.

§ 1º - O aceiro de que trata o inciso IV deste artigo deverá ter sua largura duplicada quando se destinar à proteção de áreas de florestas e de vegetação natural, de preservação permanente, de reserva legal, aquelas especialmente protegidas em ato do poder público e de imóveis confrontantes pertencentes a terceiros.

§ 2° - Os procedimentos de que tratam os incisos deste artigo devem ser adequados às peculiaridades de cada queima a se realizar, sendo imprescindíveis aqueles necessários à segurança da operação, sem prejuízo da adoção de outras medidas de caráter preventivo.

Art. 5º - Cumpridos os requisitos e as exigências previstas no artigo anterior, o interessado no emprego de fogo deverá requerer, por meio da Comunicação de Queima Controlada, junto ao órgão competente do SISNAMA, a emissão de Autorização de Queima Controlada.

§ 1º - O requerimento previsto neste artigo será acompanhado dos seguintes documentos:

I - comprovante de propriedade ou de justa posse do imóvel onde se realizará a queima; 

II - cópia da autorização de desmatamento, quando legalmente exigida; 

III - Comunicação de Queima Controlada.

§ 2º - Considera-se Comunicação de Queima Controlada o documento subscrito pelo interessado no emprego do fogo, mediante o qual ele dá ciência ao órgão do SISNAMA de que cumpriu os requisitos e as exigências previstas no artigo anterior e requer a Autorização de Queima Controlada.

Art. 6º - Protocolizado o requerimento de Queima Controlada, o órgão competente do SISNAMA, no prazo máximo de quinze dias, expedirá a autorização correspondente.

Parágrafo único - Não expedida a autorização no prazo estipulado neste artigo, fica o requerente autorizado a realizar a queima, conforme comunicado, salvo se, se tratar de área sujeita à realização de vistoria prévia a que se refere o artigo seguinte.

Art. 7º - A Autorização de Queima Controlada somente será emitida após a realização da vistoria prévia, obrigatória em áreas:

I - que contenham restos de exploração florestal;

II - limítrofes às sujeitas a regime especial de proteção, estabelecido em ato do poder público.

Parágrafo único - A vistoria prévia deverá ser dispensada em áreas cuja localização e características não atendam ao disposto neste artigo.

Art. 8º - A Autorização de Queima Controlada será emitida com finalidade específica e com prazo de validade suficiente à realização da operação de emprego do fogo, dela constando, expressamente, o compromisso formal do requerente, sob pena de incorrer em infração legal, de que comunicará aos confrontantes a área e a hora de realização da queima, nos termos em que foi autorizado.

Art. 9º - Poderá ser revalidada a Autorização de Queima Controlada concedida anteriormente para a mesma área, para os mesmos fins e para o mesmo interessado, ficando dispensada nova apresentação dos documentos previstos neste artigo, salvo os comprovantes de comunicação aos confrontantes, de que trata o inciso VI do art. 4º.

Art. 10 - Além de autorizar o emprego do fogo, a Autorização de Queima Controlada deverá conter orientações técnicas adicionais, relativas às peculiaridades locais, aos horários e dias com condições climáticas mais adequadas para a realização da operação, a serem obrigatoriamente observadas pelo interessado.

Art. 11 - O emprego do fogo poderá ser feito de forma solidária, assim entendida a operação realizada em conjunto por vários produtores, mediante mutirão ou outra modalidade de interação, abrangendo simultaneamente diversas propriedades familiares contíguas, desde que o somatório das áreas onde o fogo será empregado não exceda quinhentos hectares.

Parágrafo único - No caso de emprego do fogo de forma solidária, a Comunicação e a Autorização de Queima Controlada deverão contemplar todas as propriedades envolvidas.

Art. 12 - Para os fins do disposto neste Decreto, os órgãos do SISNAMA deverão dispor do trabalho de técnicos, habilitados para avaliar as Comunicações de Queima Controlada, realizar vistorias e prestar orientação e assistência técnica aos interessados no emprego do fogo.

Parágrafo único - Compete aos órgãos integrantes do SISNAMA promover a habilitação de técnicos para atuar junto a prefeituras municipais e demais entidades ou organismos públicos ou privados, a fim de possibilitar o fiel cumprimento deste Decreto.

CAPÍTULO III

DO ORDENAMENTO E DA SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DO EMPREGO DO FOGO

Art. 13 - Os órgãos integrantes do SISNAMA poderão estabelecer escalonamento regional do processo de Queima Controlada, com base nas condições atmosféricas e na demanda de Autorizações de Queima Controlada, para controle dos níveis de fumaça produzidos.

Art. 14 - A autoridade ambiental competente poderá determinar a suspensão da Queima Controlada da região ou município quando:

I - constatados risco de vida, danos ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis;

II - a qualidade do ar atingir índices prejudiciais à saúde humana, constatados por equipamentos e meios adequados, oficialmente reconhecidos como parâmetros;

III - os níveis de fumaça, originados de queimadas, atingirem limites mínimos de visibilidade, comprometendo e colocando em risco as operações aeronáuticas, rodoviárias e de outros meios de transporte.

Art. 15 - A Autorização de Queima Controlada será suspensa ou cancelada pela autoridade ambiental nos seguintes casos:

I - em que se registrarem risco de vida, danos ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis;

II - de interesse e segurança pública;

III - de descumprimento das normas vigentes.

CAPÍTULO IV

DA REDUÇÃO GRADATIVA DO EMPREGO DO FOGO

Art. 16 - O emprego do fogo, como método despalhador e facilitador do corte de cana-de- açúcar em áreas passíveis de mecanização da colheita, será eliminado de forma gradativa, não podendo a redução ser inferior a um quarto da área mecanizável de cada unidade agroindustrial ou propriedade não vinculada a unidade agroindustrial, a cada período de cinco anos, contados da data de publicação deste Decreto.

§ 1º - Para os efeitos deste artigo, considera-se mecanizável a área na qual está situada a lavoura de cana-de-açúcar, cuja declividade seja inferior a doze por cento.

§ 2º - O conceito de que trata o parágrafo anterior deverá ser revisto periodicamente para adequar-se à evolução tecnológica na colheita de cana-de-açúcar, oportunidade em que serão ponderados os efeitos sócio-econômicos decorrentes da incorporação de novas áreas ao processo de colheita mecanizada.

§ 3º - As novas áreas incorporadas ao processo de colheita mecanizada, nos termos do parágrafo anterior, terão a redução gradativa do emprego do fogo como método despalhador e facilitador do corte da cana-de-açúcar conforme o caput deste artigo, contada a partir da publicação do novo conceito de área mecanizável. 

§ 4º - As lavouras de até cento e cinqüenta hectares, fundadas em cada propriedade, não estarão sujeitas à redução gradativa do emprego do fogo de que trata este artigo.

Art. 17 - A cada cinco anos, contados da data de publicação deste Decreto, será realizada, pelos órgãos competentes, avaliação das conseqüências sócio-econômicas decorrentes da proibição do emprego do fogo para promover os ajustes necessários nas medidas impostas. 

CAPÍTULO V

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 18 - Fica criado, no âmbito do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, o Sistema Nacional de Prevenção e Combate a Incêndios Florestais PREVFOGO.

Parágrafo único - O PREVFOGO será coordenado pelo IBAMA e terá por finalidade o desenvolvimento de programas, integrados pelos diversos níveis de governo, destinados a ordenar, monitorar, prevenir e combater incêndios florestais, cabendo-lhe, ainda, desenvolver e difundir técnicas de manejo controlado do fogo, capacitar recursos humanos para difusão das respectivas técnicas e para conscientizar a população sobre os riscos do emprego inadequado do fogo.

Art. 19 - O IBAMA deverá exercer, de forma sistemática e permanente, o monitoramento do emprego do fogo e adotar medidas e procedimentos capazes de imprimir eficiência à prática da Queima Controlada e ao PREVFOGO.

Art. 20 - Para os efeitos deste Decreto, entende-se como incêndio florestal o fogo não controlado em floresta ou qualquer outra forma de vegetação.

Art. 21 - Ocorrendo incêndio nas florestas e demais formas de vegetação, será permitido o seu combate com o emprego da técnica do contrafogo.

Art. 22 - Será permitida a utilização de Queima Controlada, para manejo do ecossistema e prevenção de incêndio, se este método estiver previsto no respectivo Plano de Manejo da unidade de conservação, pública ou privada, e da reserva legal.

Art. 23 - Continua regido pela legislação própria o emprego do fogo para o combate a pragas e a doenças da agropecuária e em operações de controle fitossanitário, a cujos procedimentos não se aplicam as normas deste Decreto.

Art. 24 - Mediante a celebração de convênios, os órgãos do SISNAMA deverão articular-se com as entidades competentes pela fiscalização das rodovias federais, estaduais e municipais, no sentido de que, ao longo das respectivas faixas de domínio, aceiros sejam abertos e mantidos limpos.

Art. 25 - O descumprimento do disposto neste Decreto e das exigências e condições instituídas em razão da aplicação de suas normas sujeita o infrator às penalidades previstas nos artigos 14 e 15 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, e na Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998.

Art. 26 - Os órgãos do SISNAMA baixarão normas complementares a este Decreto, no prazo de sessenta dias contados da data de sua publicação.

Parágrafo único - As normas complementares a que se refere este artigo deverão conter orientações detalhadas sobre os procedimentos a serem adotados pelos interessados em obter autorização para o emprego do fogo, e todas as informações que possam facilitar e agilizar o processamento dos requerimentos correspondentes.

Art. 27 - Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 28 - Fica revogado o Decreto nº 97.635, de 10 de abril de 1989.